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sábado, 6 de novembro de 2010

FRONTEIRAS DO SABER

Como os viajantes do mundo podem contribuir com a sua aula
 “Quem conhece sua comunidade, conhece o mundo. O contrário não acontece”, já dizia Paulo Freire. Pois é. Neste mês, a Profissão Mestre foi buscar histórias de pessoas comuns que têm como estilo de vida estudar, pesquisar e ir a campo para descobrir quais são as aventuras que o mundo reserva a quem se dispõe a estudá-lo.
A primeira parada é na história de Eduardo Fenianos, o urbenauta. Ele viaja por Curitiba e São Paulo em busca de aventura. A idéia é sempre desbravar a cidade, descobrir ruas, costumes, natureza e aquele agito que passa despercebido no dia-a-dia. “A cidade é uma grande sala de aula”, afirma Fenianos.

Na rua ao lado
Ele conta que, antes de adotar o estilo de vida que possui agora, sonhava em fazer uma grande viagem. Até que um dia, conversando com um senhor que já viajara por vários países e continentes, descobriu que ele não sabia sequer o nome da rua que passava atrás da própria casa. “Perguntei se ele já tinha parado para conversar com o vizinho e ele disse que não. Foi então que percebi que, em vez de ir para um lugar distante em busca de novidade e conhecimento, eu poderia vasculhar lugares que achava que já conhecia e extrair daí cultura e lazer”, explica.
Quem também segue a cartilha de Paulo Freire, mas sem se incomodar em partir, é a Família Schürmann. Heloísa, Vilfredo e os filhos já passaram mais de dez anos dentro do veleiro. “Conhecemos tão bem cada pedaço do barco que, se acontecer qualquer barulho, por menor que seja, todos percebemos e ainda somos capazes de identificar de onde vem”, diz o marinheiro.
Essa percepção mais aguçada, esse olhar capaz de “desacostumar” com o que é corriqueiro e de identificar os mínimos detalhes de um ambiente ou objeto são imprescindíveis para a educação, como você bem sabe. O que talvez ainda não tenha feito é ensinar seus alunos a expandirem a própria visão. Visão de mundo, do contato com o ser humano, com os seres vivos,  a natureza e as idéias.
É esse o trabalho realizado, mesmo sem querer, por descobridores como Eduardo Fenianos e a Família Schürmann. Heloísa conta que, durante as voltas que deu ao mundo, os filhos dela estudaram um pouco por correspondência e um pouco nas escolas dos países, ilhas e pequenos povoados onde o barco atracava. Dessa maneira, eles eram obrigados a conviver com o diferente, a se desapegar e a seguir em frente.

 “Andarilhos
” do mar
Para ela, que além de mãe e velejadora é professora por formação, esse aprendizado serviu para que os jovens navegadores tivessem a sua curiosidade aguçada ao mesmo tempo em que tinham as suas certezas sempre questionadas por novas idéias e formas de vida.
Um exemplo desse conhecimento é dado por Vilfredo Schürmann. “Uma vez eles foram para uma escola no arquipélago de Tonga, no Pacífico, e lá, todos vão de saia para o colégio. Além disso, as relações entre professores e alunos são diferentes. Ninguém pergunta nada ao mestre, pois a crença é de que ele detém o saber. Nossos filhos não tinham esse conhecimento e começaram a questionar”, lembra.
Ele explica que, na aula de Ciências, o professor disse que só havia uma forma de energia, a elétrica, e os meninos disseram que não, pois no barco são utilizadas energias hidráulica, eólica e solar também. “Os outros alunos começaram a fazer perguntas aos nossos filhos e deixaram o professor de lado. Fomos chamados para conversar com o diretor porque aquela atitude era estranha para eles. Com a nossa presença, aquela escola percebeu que era preciso dialogar com os estudantes e pesquisar muito mais para suprir a curiosidade deles. Foi uma mudança que nos deixou muito orgulhosos”, revela.

Sala de aula
Viagens e descobertas têm muito a ver com a aventura da aprendizagem, e esses desbravadores sabem disso. Tanto que encontraram formas de entrar nas escolas do Brasil e do mundo para levar o conhecimento que adquiriram para as novas gerações.
Eduardo Fenianos, por exemplo, escreve livros nos quais relata maneiras de utilizar a cidade como sala de aula e lançar mão da interdisciplinaridade para que os estudantes aprendam maneiras diferentes de experimentar o mundo em que vivem. “Fizemos uma experiência com um professor e, por algum tempo, ele utilizava a água dos rios para ensinar a Teoria de Arquimedes. Ao mesmo tempo, os estudantes aprendiam a desfrutar e cuidar do meio ambiente”, comenta o urbenauta.
Esse é o princípio do livro que Fenianos vai lançar no início do ano que vem, dentro de uma proposta de “cidades educadoras”. “Esse material é exclusivo para professores porque vai ajudar o educador a aguçar a curiosidade dos estudantes”, diz ele.
A Família Schürmann, por sua vez, dá palestras em escolas e empresas contando como trabalha para que os planos se realizem nos momentos apropriados, sem que haja sabotagem por parte da equipe, sem que o prazer da navegação e das descobertas sejam superados pelos problemas inesperados.

Exemplos e contatos
Outro trabalho realizado por eles é permitir que as viagens sejam acompanhadas via Internet por 35 milhões de pessoas, de 44 países ao redor do mundo. Muitos dos acompanhantes são professores que interagem com a família através do site. “Uma vez estávamos em uma ilha do Pacífico e uma professora pediu para tirarmos uma foto ao lado de um pé de jaca, porque as crianças moravam lá no centro dos Estados Unidos e não sabiam descrevê-la”, informa Heloísa. “Então, eu tirei uma foto do Vilfredo ao lado de um pé de jaca, com uma fruta na mão, para que as crianças pudessem saber como é”, explica.
Ela afirma que a família se dispõe a filmar e fotografar relevos, animais e estruturas arquitetônicas sempre que um professor pede. “Temos um arquivo fotográfico imenso, e disponibilizamos todo esse material para as escolas que se interessem. Seja através de e-mail ou da visita de escolas ao nosso Parque Ambiental”, conta, se referindo ao espaço criado pela família na praia de Bombinhas, litoral de Santa Catarina.

Kelly Roncato
Para saber mais:

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